O Brasil estatisticamente possui destaque no ranking mundial no que se refere aos acidentes do trabalho. Para termos noção da importância do tema, saúde e segurança ocupacional, basta observar que no Brasil, em 2007, ocorreu cerca de 1 morte a cada 3 horas, motivada pelo risco decorrente dos fatores ambientais do trabalho e ainda cerca de 75 acidentes e doenças do trabalho reconhecidos a cada 1 hora na jornada diária. Em 2007 observamos uma média de 31 trabalhadores/dia que não mais retornaram ao trabalho devido a invalidez ou morte. Os números constam das informações do site oficial da Previdência Social na rede mundial de internet.
Aliado à polêmica da falta de segurança e prevenção aos acidentes no ambiente laboral, surge questão tormentosa na Justiça do Trabalho no que diz respeito aos prazos para ajuizamento da ação em que se pleiteia indenização decorrente de acidente do trabalho.
Há tempos a jurisprudência sobre a matéria vem adotando o entendimento de que o prazo prescricional do fundo de direito somente passa a ocorrer após o trabalhador tomar conhecimento da sua incapacidade, nos termos da Súmula 278 do STJ, editada em 14/05/2003, com a seguinte redação: “O termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral”.
A discussão torna-se mais interessante quando da interpretação do termo ciência inequívoca frente à natureza dos benefícios por incapacidade concedidos pela Previdência Social. Explico.
É que o primeiro afastamento decorrente de acidente do trabalho, salvo raras exceções, se dá pela concessão do benefício de auxílio-doença acidentário, que pela sua própria natureza, consiste em benefício de caráter temporário.
Corroborando com a natureza de caráter temporário deste benefício por incapacidade, o Decreto 5.844/06 acrescentou nova redação ao art.78 do Regulamento da Previdência Social, passando a vigorar acrescido do seguinte parágrafo:
§1o O INSS poderá estabelecer, mediante avaliação médico-pericial, o prazo que entender suficiente para a recuperação da capacidade para o trabalho do segurado, dispensada nessa hipótese a realização de nova perícia.
O auxílio-doença acidentário, portanto, possui como característica principal a permanência da incapacidade pela não consolidação das lesões. Uma vez consolidada a lesão, abre-se a investigação para três diferentes situações, a saber: primeira, que se dá com a plena recuperação do segurado, sem qualquer seqüela que lhe reduza, mesmo que parcialmente, sua capacidade laboral – neste caso, ocorre tão somente a cessação do benefício previdenciário; segunda, quando apesar da consolidação das lesões e cessação do benefício de auxílio-doença, permanecerem seqüelas que causam limitação funcional e evidente desvantagem do segurado em relação a outros trabalhadores da mesma função ou atividade habitual (nesta situação, deve lhe ser concedido o benefício de auxílio-acidente); por fim, a terceira possibilidade, mais gravosa, quando consolidadas as lesões incapacitantes, o segurado acidentado permanece com redução total e definitiva de sua capacidade laboral, não podendo, inclusive, ser reabilitado em outra função (caso em que o auxílio-doença cessa e a aposentadoria por invalidez há de ser concedida).
De suma relevância transcrever o disposto no art.86 e seu § 2º, da Lei 8.213/91, in verbis:
Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
§ 2º O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado, vedada sua acumulação com qualquer aposentadoria.
Ou seja, a concessão do auxílio-acidente configura, para o acidentado, ciência inequívoca das suas lesões, em face da sua necessária consolidação, da mesma forma como ocorre com a concessão da aposentadoria por invalidez.
Assim, como é cediço, enquanto o acidentado permanece recebendo o auxílio-doença acidentário é porque ainda não houve a consolidação das lesões, razão pela qual permanece discutível a ciência inequívoca de sua incapacidade e, por conseguinte, torna-se inviável o início da fluência do prazo prescricional.
Referido entendimento se coaduna, ainda, com o princípio constitucional da proteção social ao trabalhador e segurado, bem como leva em consideração a notória relação de hipossuficiência do mesmo em relação ao seu empregador.